A Advocacia-Geral da União conseguiu, junto ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), liminar que suspende a demolição de casas da comunidade quilombola Kédi, localizada em área urbana de grande valor imobiliário em Porto Alegre (RS). A decisão beneficia 41 famílias que compõem a comunidade.
Há anos, empreendedores do setor mobiliário tentam comprar o terreno, com autorização da justiça estadual para fazer acordos e demolir casas.
A atuação se deu em ação de manutenção de posse ajuizada pelas lideranças quilombolas da comunidade da Vila Kédi, inicialmente na Justiça Estadual. Com o reconhecimento da comunidade como quilombola pela Fundação Cultural Palmares (FCP) em 2023, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) interveio na ação como assistente dos autores, que passou à esfera federal.
“Embora a autarquia não possa impedir acordos voluntários, o Incra tem o dever de impedir a destruição das estruturas físicas ou outras formas de esbulho e turbação que afetem a permanência dos quilombolas que buscam a concretização de seu direito constitucional.” afirma o procurador federal Verner Vencato Kopereck, que atuou no caso.
Apagamento Histórico
A Procuradoria Regional Federal da 4ª Região (PRF4), unidade da AGU que representa o Incra, defendeu a posse tradicional da comunidade, a aplicação imediata do direito constitucional e a necessidade de interromper os atos de turbação (perturbação da posse) decorrentes de interesses imobiliários e ações municipais que levariam ao apagamento histórico da comunidade.
“O direito à terra dos quilombolas transcende o direito à moradia; é um direito fundamental cultural (Art. 215 da CF) e uma condição material necessária para a subsistência da identidade coletiva e a preservação da cultura do grupo.” explica Vencato.
Descaracterização territorial
Os procuradores federais apresentaram imagens que mostram o avanço das demolições, que têm transformado a área em um cenário de destruição e comprometido as condições de moradia e permanência dos habitantes. “As ações causam dano irreparável ao descaracterizar o território e impor pressão sobre os moradores, atingindo sua dignidade habitacional”, conclui o procurador federal.
“De nada adianta indenizar as famílias e mandar cada núcleo para um local diferente. Isso destrói o quilombo, que é uma comunidade reconhecida, com identidade própria”, complementa Camila Martins, coordenadora do Núcleo de Atuação Prioritária da PRF4.
A decisão assegurou a posse coletiva e proibiu expressamente o despejo ou reassentamento das 41 famílias e lideranças da comunidade.
A procuradora federal Patrícia Rossato Nunes, coordenadora-geral jurídica de territórios quilombolas da Procuradoria Federal Especializada (PFE/Incra), destaca que a atuação foi crucial para garantir a permanência das famílias em condições dignas e viabilizar ao Incra a possibilidade de concluir o processo de regularização fundiária. Sobre a decisão, ela afirma que “a liminar traduz o entendimento consolidado no STF quando do julgamento da ADI 3239, garantindo imediata proteção aos direitos territoriais das comunidades quilombolas.”
Processo de referência: AI 5031480-82.2025.4.04.0000
Por Advocacia-Geral da União
